domingo, 17 de outubro de 2010
Um outro cinema possível
“Um filme que precisa ser visto e revisto”, afirmou Heitor Augusto do Cineclick. Realmente é muito difícil falar alguma coisa sobre Tropa de Elite 2 logo após sair da sala do cinema.
O fato é que esta sequência é um fenômeno sob diferentes aspectos.
O primeiro deles é que Tropa 2 tornou-se um marco por ser a maior bilheteria de estreia do cinema nacional desde a Retomada e a quinta maior entre filmes nacionais e estrangeiros.
O esforço da equipe do filme para que desta vez não houvesse vazamento antes do lançamento colaborou muito. Se a própria pirataria provocou o alvoroço e o interesse pelo primeiro longa, o sucesso do segundo se vale pela intensa e crítica referência a uma realidade muito atual, muito polêmica.
José Padilha acertou ao idealizar a continuação da história do, agora, coronel Nascimento. Sua história tem muito potencial, é muito representativa. Arrisco dizer que é possível uma terceira sequência, que pode finalizar sua saga. Mas acredito que com o segundo o diretor já tenha alcançado a ideia principal de seu argumento, sua crítica ao sistema.
O público em geral quando vai ao cinema parece procurar em Tropa 2 as cenas, os jargões e até mesmo a violência do 1. Mas diante da tela o que ele encontra como resposta não é aquilo que se assiste com distanciamento, como nos filmes de ação de Hollywood (embora esta estrutura tenha sido utilizada e bem explorada). Mostra-se para a sociedade a própria sociedade.
Sistema carcerário, direitos humanos, corrupção, discurso político, discurso midiático, violência policial, desigualdade social, poder, todos estes e mais alguns são os principais temas desenvolvidos. Parece muita coisa para apenas 118 minutos, mas essa capacidade do cinema, para mim, o faz surpreendente.
A gente sai da sala desiludido com o sistema, pensando que não tem jeito, que política é uma m* mesmo, que é impossível mudar. Mas também pensa em como o filme é corajoso por ser tão contemporâneo, mostrando que por meio da arte é ainda possível revelar às pessoas o que às vezes é difícil de enxergar.
Desde que comecei a me interessar mais por cinema (quando realizei uma reportagem sobre cinema paraguaio), uma frase ficou na minha cabeça: “Se um país não tem cinema, ele não existe”. É triste ver o Brasil que nós temos em Tropa 2 , mas ainda assim é melhor do que não vê-lo.
Admiro muito o trabalho e o pensamento de Padilha (já escrevi sobre seu documentário Garapa aqui no Blog). Para mim, tirar o bom cinema brasileiro do círculo alternativo e do público Cult e restrito já é um grande mérito de toda a sua equipe, mas suscitar debates sérios em grande parte da população, fazer a arte intervir no social, é motivo para se manter otimista e ainda acreditar que é possível ver outro Brasil, dentro e fora da tela.
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4 comentários:
Um parágrafo único do seu texto já merece parabéns e eu assino junto com o que você disse:
"A gente sai da sala desiludido com o sistema, pensando que não tem jeito, que política é uma m* mesmo, que é impossível mudar. Mas também pensa em como o filme é corajoso por ser tão contemporâneo, mostrando que por meio da arte é ainda possível revelar às pessoas o que às vezes é difícil de enxergar."
Há tanta coisa errada que precisa ser mostrada. Há tanta gente anestesiada que precisa ser sacudida. E há muita gente morrendo e só virando estatística.
Salve!
Uma coisa que me incomodou um pouco não foi o que vi na tela, mas algumas reações que ouvi na sala de cinema. Mexeram comigo em especial alguns comentários logo no início do filme criticando o personagem Fraga (ativista dos Direitos Humanos).
As pessoas falavam dele concordando com alguns pensamentos expostos pelo Nascimento como se ele fosse um mero "protetor de marginais". Outra coisa que me entristeceu logo depois foi o sensação de que as pessoas aprovavam a ideia de deixar os presos se matarem entre si.
O filme em si (roteiro, fotografia, elenco etc) é muito bom. Para quem não viu, vale a pena!
"Não vi o filme ainda".
Mas parabéns pelo seu texto, ótimo.
Zé
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